Capítulo 24
Chamados da Aliança Esquecida
Quando a promessa atravessa séculos e o destino cobra sua fé
Horas antes da reunião final na sala secreta da Ordem da Coruja, Lázaro sentou-se diante de um antigo telefone de disco, isolado em seu quarto. A madeira das paredes parecia reter o silêncio com respeito, e apenas o tic-tac do antigo relógio marcava o tempo. Ele girou os números lentamente. A primeira ligação cruzou distâncias insondáveis.
— Alô. Sua voz era firme, com o peso de quem traz a alvorada em seu peito. O tempo é chegado.
Do outro lado da linha, uma voz serena, como se medisse cada palavra com exatidão:
— Pode contar comigo.
Era Virgem.
No passado, Virgem pertencera à Ordem Nocturnis, mas deixou-a após o segundo confronto de Lázaro contra Capricórnio. Cansado das trevas e da manipulação, vagou pelo mundo em busca de redenção. Foi em 1703, na pequena e ancestral cidade de Gjirokastër, ao sul da Albânia, que o destino uniu novamente Virgem e Escorpião.
Naquele tempo, Virgem enfrentava a temível Irmandade das Serpentes, um culto nórdico que sobrevivia desde os tempos pagãos e acreditava que o mundo deveria retornar à escuridão primitiva. Seus membros se vestiam com peles de serpentes albinas, e suas pupilas eram modificadas ritualmente para imitarem as das cobras. Eram silenciosos, frios, e moviam-se como sombras em corredores apertados. Cada um deles possuía veneno nas veias, literalmente: um soro ritualístico os tornava mortais ao simples toque.
Virgem estava prestes a ser vencido quando Lázaro apareceu, silencioso como sempre. Com um giro rápido, disparou sua lâmina oculta contra o portador da marca da Serpente. Em segundos, os membros restantes tombaram, consumidos por um fogo azulado que se ergueu de seus corpos. Desde aquele dia, Virgem selou sua promessa.
— Estarei contigo no momento da convergência.
A segunda chamada foi ainda mais silenciosa, mas carregava um peso distinto. Lázaro digitou os números como quem evoca fantasmas.
— Alô, minha velha amiga.
Sua voz era baixa, com um tom antigo, denso, carregado de memórias. Do outro lado, a voz de Libra respondeu com suavidade, mas também com firmeza:
— Eu também senti o momento. Estarei com você no instante exato.
Era 1912. Libra enfrentava a Sociedade dos Lírios de Ferro, uma organização secreta composta apenas por mulheres treinadas em artes místicas e de combate. Elas usavam capas bordadas com lírios cravados em ferro, e eram capazes de erguer um ônibus com as próprias mãos. Libra derrotara oito delas, mas estava ferida, exausta, e prestes a tombar diante das quatro restantes.
Foi quando Escorpião surgiu das trevas. Com um salto, atravessou o ar e cravou ambas as adagas ocultas na terra. Um estrondo ecoou. Do solo ergueram-se chamas em forma de espiral. As quatro mulheres restantes foram envolvidas por correntes astrais douradas e desfaleceram sob o selo do escorpião.
Desde então, Libra nunca mais hesitou.
Após as ligações, Lázaro guardou o telefone com reverência. Sentia-se completo. Não estava mais só.
Ele entrou então na sala secreta. Era o exato momento em que Andressa, diante da Ordem reunida, recebia a espada criada pelas três borboletas e pelos cadernos ancestrais.
A energia da arma cintilava em tons prateados, violeta e dourado, e a inscrição reluzia em fogo vivo: “In nocte, lux. In morte, vita. In silentio, ordinem.”
Agora, com a espada da Ordem em mãos, Andressa estava completa. E com Libra e Virgem a caminho, o cerco se fechava.
Na colina onde Aurora fora enterrada, a neblina dançava como um manto espesso. O céu estava sem lua. O relógio marcava.
2h45 da manhã.
O tempo se aproximava. A convergência já podia ser sentida vibrando sob os pés.
E nas sombras, as asas dos morcegos preparavam-se para voar contra o veneno do Escorpião.
Continua...