Imagem: Meta
Ela nasceu com olhos virados ao avesso,
via o futuro nas dobras do lençol,
lia segredos nas sombras dos postes
e conversava com o tempo que ainda não chegou.
Tinha nos dedos galhos de relógios
e no peito um pássaro que dormia só à noite.
Dizia que as árvores falavam em mapas,
e que as nuvens carregavam cartas não enviadas.
Brincava com o eco de passos que ainda não haviam pisado,
pedia conselhos ao silêncio que vinha do porvir
e ria de gente que ainda não nascera.
“Eles vêm,” dizia, “mas não sabem onde guardar o medo.”
Certa manhã, desenhou um mundo invertido:
as casas andavam e os homens criavam raízes.
Chorou diante de um espelho que não a reconheceu
e cochichou ao vento: “a memória será a primeira a sumir.”
Ela sabia do que ninguém queria saber:
que o amanhã não é lugar, é espelho quebrado.
E que só os puros podem olhar sem enlouquecer
o tempo que ainda está se escrevendo em silêncio.
Desde então, dorme entre véus e visões,
e às vezes sorri para o nada com doçura.
Porque há quem veja monstros no escuro,
ela via verdades demais na luz do futuro.
"Ela não brincava com brinquedos, brincava com o tempo, moldando o amanhã com os dedos sujos de imaginação."