× Capa Meu Diário Textos Áudios E-books Fotos Perfil Livros à Venda Livro de Visitas Contato

Cançoes & Poesias
Onde Melodias Encontram Versos e a Arte em Harmonia Flui
Textos

A imagem de capa do conto é a personagem Carla 

 

Capítulo IV

Segredos, Cartas e Tempestades

Quando o silêncio carrega verdades e o destino se curva diante do passado.

 

 Jandira andava inquieta pelos corredores de pedra da antiga casa. Sabia que a hora havia chegado. O semblante de sua jovem sinhá não escondia mais a agonia que a corroía desde o dia em que retornara do casarão dos Costas. Carla podia fingir força diante dos funcionários e dos negócios, mas a empregada, que a conhecia desde os primeiros passos, via muito além.

 

 Ao fim de uma tarde abafada, quando o sol se punha por entre os parreirais tingindo de laranja os telhados vermelhos da fazenda, Jandira tomou coragem. Bateu à porta do quarto de Carla com as mãos trêmulas e o coração apertado. A moça permitiu a entrada com voz cansada, sem levantar os olhos do papel que fingia ler.

— Sinhá... — disse Jandira, curvando-se ligeiramente, com o lenço encardido nas mãos — sua avó me confiou um segredo quando a sinhá ainda era uma menina de cinco anos. E me fez jurar que só abriria a boca quando ela deixasse este mundo. Eu... eu tentei manter esse juramento. Mas acho que agora... a senhora precisa saber.

 

Carla levantou os olhos devagar. Havia algo sombrio em seu olhar. Desde que voltara da tentativa frustrada de encontrar se com André, tornara-se ainda mais calada. A lembrança do lenço e dos bilhetes em sua gaveta doía como punhal.

 

— Quem era Lilian? — perguntou sem rodeios, como se esperasse por aquela revelação a vida inteira.

 

Jandira respirou fundo, sentou-se na cadeira de palhinha ao lado e ajeitou a barra da saia. — Lilian... era alguém que sua avó conheceu, foi a primeira esposa do seu pai. Depois que tiveram um filho e não puderam, mas se esconder, os Costas e os Mancinis decidiram separar os dois e foi onde tudo começou e dura até hoje. Quando a sinhá era pequena, sua avó me chamou uma noite e me disse: “Jandira, um dia minha neta vai querer saber. Mas só diga quando eu não estiver mais aqui para protegê-la dessa dor.”

 

Carla ouvia sem piscar. Jandira continuou: — Naquela noite, quando a sinhá foi ao casarão dos Costas atrás do moço André, eu soube que não ia ser bom. Mandei um primo meu, o Benedito, a cavalo, pra avisar o homem que levou a sinhá de volta que dissesse que André não estava. Eu juro por tudo que é sagrado, sinhá... eu não sabia que ele ia viajar... muito menos naquele navio maldito.

 

Carla assentiu devagar. Apesar da dor, não via mentira nos olhos cansados de Jandira. Desde então, tentava seguir com os dias. Passava pelas plantações, falava com os trabalhadores, mantinha a produção sob controle. Mas no silêncio do seu quarto, o vazio era ensurdecedor.

 

Naquela noite, após o jantar, retirou-se mais cedo. Ao chegar em seu aposento, abriu a gaveta da penteadeira. De lá tirou um lenço branco com as iniciais A.D.C. bordadas em azul e os bilhetes que André deixara antes de tudo desandar. Havia um que ela ainda não tivera coragem de abrir, o que o homem lhe entregara pouco antes de ela receber a notícia do naufrágio.

 

A vela lançava sombras trêmulas nas paredes enquanto Carla passava os dedos sobre o papel dobrado. Não abriu.

 

Apenas o guardou de volta e deitou-se com o coração espremido.

 

André soubera por um conhecido que Carla pretendia embarcar também. Decidira, então, surpreendê-la. Seria o lugar perfeito para tentarem um encontro, longe da guerra entre as famílias e dos olhares enviesados de Jundiaí.

Chegou ao porto com uma hora de antecedência. Dirigiu-se à administração e consultou a lista de passageiros do Titanic. Vasculhou cada nome. Mas não havia qualquer menção a "Carla F. Mancini". O coração apertou.

 

— Talvez tenha ido por outro meio — murmurou para si mesmo. Naquela época, além de transatlânticos, algumas pessoas viajavam por navios menores de carga, navios a vela de comerciantes portugueses, ou mesmo trens até portos alternativos, de onde partiam embarcações francesas ou italianas.

 

Sem perder a esperança, André decidiu não esperar mais. Embarcou em um navio mercante com destino à América. Antes de partir, escreveu um bilhete. Nele, dizia tudo que sentia. Explicou seus planos e falou de seu amor.

 

Entregou o bilhete ao mesmo homem que levara Carla de volta à fazenda naquela noite — chamava-se Antônio Batista, antigo conhecido da família Mancini e de confiança dos Costas. Pediu que entregasse à moça caso o encontro no navio não acontecesse.

 

De volta à fazenda, os dias corriam mornos. Jandira observava Carla com atenção dobrada. A tristeza começava a se enraizar nos olhos da moça. Resolveu, então, que já era tempo de contar tudo sobre o nome que encontraram no caderno da avó: o nome de seu pai.

 

Na varanda de madeira envernizada, com o cheiro de jasmins flutuando no ar, Jandira se aproximou mais uma vez. — Sinhá... eu também preciso lhe dizer o motivo daquele nome no caderno. Há algo que a senhora precisa entender sobre seu pai...

 

Carla se virou devagar, com o olhar afundado em memórias e mágoas. Mas antes que Jandira dissesse qualquer palavra, um tropel de passos apressados invadiu o silêncio da casa.

 

Um dos empregados, Sebastião, entrou pela porta da frente com a camisa suada, as botas cobertas de poeira e o chapéu amarrotado na mão. — Perdoa, dona Jandira... perdoa, sinhá Carla..., mas a senhora precisa ver o que aconteceu com o carregamento que ia pra cidade.

 

Carla se levantou de imediato. O coração acelerou. Não era comum aquele tom aflito. — Que carregamento, Sebastião? O das uvas de mesa?

 

— Sim, sinhá... aquele mesmo. Os caixotes foram revirados, os cavalos se soltaram da carroça, e tudo tá espalhado na estrada. Parece coisa de gente que quis atrapalhar.

 

Carla apertou os lábios. A rivalidade entre famílias voltava a rondar seus passos? Ou seria apenas um acidente? Pensou em André, pensou na carta ainda fechada, pensou nas revelações de Jandira. O mundo parecia desabar sobre ela.

 

— Preparem outro transporte — disse com firmeza. — E digam ao capataz que eu mesma irei verificar o estrago.

Jandira segurou seu braço. — Sinhá, talvez seja perigoso.

 

— Já enfrentei coisa pior — respondeu Carla com a altivez herdada da avó. — E agora, mais do que nunca, preciso entender o que está acontecendo.

 

Ao chegar ao local do incidente, Carla viu com os próprios olhos o caos: uvas pisoteadas, palhas espalhadas, caixotes quebrados. Os cavalos haviam sido encontrados amarrados mais adiante. Tudo indicava sabotagem.

 

— Não foi o acaso — murmurou, mais para si do que para os outros. Algo lhe dizia que aquilo era um aviso.

 

Na volta, a carruagem balançava pelas estradas estreitas de terra batida. Carla olhava pela janela, o olhar perdido. A imagem de André, de Jandira, do bilhete ainda fechado — tudo se misturava num redemoinho dentro de si.

À noite, sentou-se diante da penteadeira novamente. As mãos hesitavam, mas o coração já sabia: precisava abrir a carta. Precisava enfrentar o que quer que estivesse escrito ali.

 

------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------

Quem poderia ter sabotado o carregamento de Carla. O que realmente André escreveu no bilhete? E Jandira contará toda a verdade sobre quem realmente é Lilian e a ligação com o pai?

 

Capítulo 5 e uma possível conclusão

 

A Sales
Enviado por A Sales em 04/06/2025
Copyright © 2025. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.
Comentários