Lá pras banda do sertão,
Num vilarejo esquecido,
Dois matuto bom de roça
Viviam bem, sem partido.
Mas tudo mudou de vez
Quando o amor foi metido.
Zé Bentinho era ligeiro,
Bom de prosa e bom de dança.
Já João Cego era calado,
Mas guardava esperança.
Ambos viram, num domingo,
Chegar a tal de Esperança.
Moça bela, olhos de estrela,
Sorriso de arrepiar.
Filha nova do vigário,
Veio só pra visitar.
Mas bastou um só olhar
Pra os dois começar brigar.
Zé mandou flores do campo,
Fez um verso rimadinho.
João fez pão de macaxeira
Com café bem quentinho.
Cada um, com seu jeitinho,
Foi tentar ganhar carinho.
Começou a confusão
Na frente da capelinha.
Zé dizia: “Ela é minha!”
João gritava: “Sai da linha!”
E o padre, vendo o arranca,
Rezava Ave-Maria!
Certa noite a tal moça
Chamou os dois pra conversar:
“Vocês brigam como burros,
Nem tentam me escutar.
Não sou prêmio de ninguém
Pra ficar a disputar!”
“Zé só pensa em namorar,
João quer logo casar.
Mas nenhum perguntou nunca
O que eu gosto de sonhar.
Se é bordar ou se é estudar,
Ou se quero me mudar!”
Com vergonha na feição,
Os dois foram refletir.
De que vale o sentimento
Se não deixa a moça rir?
E aprenderam, cabra macho,
Que é melhor repartir.
Hoje Zé virou vaqueiro,
João foi vender carvão,
E Esperança foi pra escola,
Virou moça de opinião.
E os dois matuto juraram
Nunca mais brigar por paixão.
Moral pra quem tá me ouvindo,
Nessa rima de valor:
O amor não é disputa,
Nem se impõe com desamor.
Quem quiser ter companhia
Precisa ter mais pudor!